"Ao mesmo Deus que ensina a prazo
Ao mais esperto e ao mais otário
Que o amor na prática é sempre ao contrário" - Cazuza
Indo em direções contrárias iam corações contrários. Amor é dor a longo prazo, sabiam, arriscaram. E antes de narrar a separação de duas almas é necessário contar o início dos dias mais coloridos de ambas as partes envolvidas.
Ela Mariana, 23, fotógrafa, ama antiquários, odeia casas verdes. Ele Luciano, 25, artista plástico, ama a chuva, odeia cheiro de morango - não o morango. Tinham costumes diferentes, quase opostos, porém em um dia em que o café frequentado por Mariana e o bar por Luciano estavam fechados resolveram, ao mesmo tempo, ir ao museu da cidade. A exposição parecia mostrar as piores obras do pintor. "Se me der um gato e um balde de tinta eu reproduzo esse quadro" - Luciano disse a Mariana enquanto olhavam para o mesmo quadro e faziam a mesma expressão. Ela riu. Ele a convidou para um café, "O café está fechado!" - respondeu, continuou: "Que tal uma cerveja?". "O bar está fechado." - Respondeu triste Luciano. "Não quer andar um pouco por aí?" - Perguntou Mariana, que ficou encabulada até receber o "sim" amoroso.
O "andar por aí" se transformou em "quer subir?", que depois de algumas semanas virou "quer namorar comigo?". "Brigas todos têm" - Diziam enquanto se abraçavam no fim de alguma discussão. Passaram semanas, meses, então três anos. O namoro parecia ser eterno, mas o cheiro dos perfumes enjoava tanto quanto os olhares. O amor se tornou ódio. E o fim foi declarado em plena estação do metrô.
- Quando você disser que chega às nove, por favor, chegue às nove.
- São só nove e meia Luciano.
- Não to disposto pra brigas, vamos logo?
- Pra onde?
- Oras. Pro museu.
- Não pode ser pro parque?
- Não Mariana. Aquela exposição em que nos conhecemos está lá de novo. E eu acho interessante comemorar três anos de namoro onde tudo começou.
- Ah, claro, mas antes eu preciso te contar uma coisa Luciano.
- Fala.
- Semana passada eu fiquei com o Eduardo.
Eduardo, 27, editor chefe, patrão de Mariana, ama manchas de tintas, odeia gritos.
- "Ficou" em que sentido?
- Nós transamos ora.
- Por quê?
- Não te interessa.
- Ta, já que é assim eu preciso confessar que transei com a Márcia.
Márcia, 29, empresária, vizinha de Luciano, ama barulho de moedas caindo no chão, odeia cheiro de velas.
- Eu não acredito!
Olharam-se, riram e partiram.
O amor não acabou, ele nunca acaba. Muda de nome, de imagem, de destinatário, de sabor, de intensidade. Muda sempre, não acaba nunca.
[Eu esqueci de assinar o desenho quando o terminei, mas é meu.]