sábado, 28 de novembro de 2009

Espera

Parado em espera teoriza a situação. Vê o mesmo homem passando duas vezes na mesma direção com um menino no colo. Encenação forçada. Figurantes sem vontade. Corre os olhos pelo rapaz torneado que o admira com desejo. Indaga-se. Admite. Perde-o de vista.
A espera continua no topo da escada. Troca de posição, encosta na parede. O chiclete sem gosto passeia entre os dentes elogiados pelo dentista da família. Nunca precisara de aparelho, orgulha-se. Lembra dos óculos guardados e dos graus irregulares de cada olho, fica feliz por não ter oftalmologista de família. Com um abraço apertado e um elogio pelo corte de cabelo a entrega começa e a espera termina.


sábado, 14 de novembro de 2009

Verdade

Maria Amélia é mulher de verdade
Lava
Passa
Cozinha
Tendo tempo, sorri
E passa pelo bairro
Com seu cabelo amarrado
Seu vestido de renda
Enquanto carrega
O menino pela mão
A trouxa na cabeça
De verdade
Maria Amélia é só.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Posters




Imagens, imagens e mais imagens. Por todos os lados. Faz de conta que tá valendo.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Do sofá

Por gotas contadas e goles amargos veio a tarde sem sal, de um mundo pequeno, opaco e sem vontade. Percorreu os canais da televisão e nada, absolutamente nada. Sozinha admirou a janela canelada de visão abstrata e sem cores. Percebeu dois carros passando rápidos em fuga. Para onde vão? Em qual esquina fica a dobra necessária para um destino certo? Levantou-se rápido na tentativa de vê-los. Não os viu. Abrira a porta por nada, fingiu para ninguém que apenas fora dar "oi" ao cachorro bobo que sempre a olha com olhos de sono e fome certa. Entrou rápido guardando no bolso a frustração. Bolso cheio. Jogou-se novamente no sofá dessarumado e querendo, porém sem grandes demonstrações, tocou-se ligeira. Resumida tentação de se amar, de ser amada. Não consegue preencher-se sozinha, tentar virara ritual. Histórias loucas passam em seus olhos enquanto se expande em si mesma. Sorriso bobo. A apresentadora do programa chato pára e a olha com repulsa e castidade. Sente-se culpada, suja, satisfeita.

O toque do telefone interrompe o transe do banho desnecessário. Não atende, imagina. Algum parente morto, algum convite chato ou talvez uma ótima proposta. Arrepende-se. Fecha o chuveiro, enrola-se na toalha rosa e sai pingando do Box na esperança de uma nova tentativa do telefone. Nada. Em plena cólera joga a tolha sobre o mesmo sofá que fora há minutos seu amante e deita no chão. O latido do cachorro impõe a realidade. Olha a sala pelos cantos dos olhos e imagina-se no meio do nada. Do vazio. De um espaço branco. Paralisa. Dorme solitária.