quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Parágrafo;

Seco ou Vodka. "A segunda opção é bem melhor!" - Ela disse antes de discordar de mim. Não fazia questão que minha opinião fosse ouvida, não fazia mesmo. Afinal quem quer ser ouvido ou respeitado? "Vamos de Vodka" - Falei abrindo a garrafa sem rótulo atrás do bar. Se pudesse correria até um lugar onde ninguém fizesse questão de me odiar. "Comece por você mesmo!" - Meu analista sempre resmunga. Como começar? Como fazer? Como? De fato nunca fui bom com começos. Quando a coisa engrena vou com toda a força, mas até aí, desmancho-me em sonhos. E sonhos são a válvula de escape e de covardia de todo ser humano. "Errado!? Eu?" - Foi o que eu disse a ela em um lapso de grandiosidade. Arrependo-me até hoje. Afinal que ser humano é esse que merece respeito se nem consegue dar um maldito parágrafo?

Por Lucas Moratelli



sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Identidade mórbida;

"Aconteceu em uma rua escura e deserta ao lado de uma catedral de estilo gótico do centro da cidade. As pessoas que passavam por lá disseram que crimes assim sempre acontecem. Apenas a carteira de identidade de Maria foi deixada intacta."

O que era de se esperar de uma rua escura ao lado de uma igreja mais escura ainda.
E de fato é absurdo o que aconteceu ao criminoso. De Maria muitos já se encarregaram de lamentar.

Atendia pelo sonoro pseudônimo de Ralph. Chamava-se Joaquim. E após fazer tudo que pretendia com a coitada da Maria teve o penoso trabalho de apagar as evidências e guardar as partes do corpo.

Passava por um inferno astral. Estava triste por saber que sua mulher preferia outro, que sua mãe tinha apenas três semanas de vida e que seu filho de quinze anos era gay. A única coisa possível de acalmá-lo era matar. Não devia ter parado de fumar! Era melhor que matar. Mas agora apenas matar funciona. E matou (!), Maria Aparecida Gomes Costa, 37 anos, que o diga.

Esperou atrás de uma coluna por trinta minutos até aparecer alguém digno de uma morte tão bela. Ligou seu tocador de mp3, colocou Ludwig van Beethoven a tocar em seus ouvidos e começou a andar atrás de Maria. Ela não percebeu. Então com um pulo digno de filme de terror, daqueles que a cena é cortada e apenas se escuta um grito aterrorizante, segurou a mulher e a adormeceu com um paninho branco encharcado de éter.

Dalí por diante foi um grande orgasmo de adrenalina misturada com satisfação.

E de Maria apenas a carteira de identidade foi deixada.

Por Lucas Moratelli

(Ficcional OK!?)


Aí você vaí pro estágio com tanta coisa na cabeça que acaba pegando o ônibus errado, e o que acontece?
Solta em algum lugar conhecido e vai andando. E derrepente se depara com uma paisagem fantástica!
(É fotografei.)
(Efeitos no Photoshop)


Inté.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Verde, alta e insegura;

Era uma palmeira como todas as outras, disto ele tinha plena certeza. Verde, alta, insegura. E por mais absurdo que parecesse aos outros, a ele tinha enorme significado. Via nela seu poder, sua grandiosidade e sua força. Olhava-a com a admiração digna de servos a reis, apenas a amava. É certo que estava confuso diante da certeza que lhe era sempre clara. Sabia que não seria fácil desvendar os mistérios de sua alma, afinal nem acreditava ou desacreditava ter uma.

Desprendeu-se de suas opiniões densas e sempre cativantes e se pôs a olhar a palmeira. Sentiu ao ver o vento cheiroso de fim de outono balançar sua palmeira cólera mortal. Quem quer que fosse indigno de mexer com sua árvore merecia a morte, porém o vento o fez. E a entortou como a uma fina vareta suspensa no ar. Seus olhos puros encheram-se de lágrimas. Talvez fosse a dor de perder, pensou ele a lembrar de seus velhos e perdidos amores. Não era. Apenas sabia que sua frágil e delicada palmeira lá ficará quando seus ossos forem pó e sua obra eterna como seus sonhos.

Por Lucas Moratelli


(Dedicado a um cara aí.)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Por alí;


"Viram quando você passou por ali?" - Perguntou o menino alto de cabelos loiros. "Espero que não" - Respondeu ofegante o menino magro com uma maleta preta na mão.


***

Eram parceiros. Mais que isso, eram irmãos. De tudo que passaram em suas juventudes à única coisa que valia lembrar era a amizade verdadeira entre os dois.

Junior, “melhor Junior, que Carlos Junior” - ele sempre dizia, era o mais velho dos dois. Desde pequeno sabia de sua grande beleza e da grande sensação de segurança que passava aos outros. Já Roberto foi sempre magro e o palhaço da dupla. Cabendo-o sempre a função de divertir a todos, mesmo quando não o queria fazê-lo.

Passaram por muitas coisas na vida juntos, e a certeza de um sempre ao lado do outro os fazia continuar. Alguns curiosos diziam sem pudor que formavam um belo casal. Já outros duvidavam de suas índoles. Mas os garotos, homens, sempre foram, esquecendo os adjetivos casuais, amigos!

Entre eles as coisas do mundo se resumiam a detalhes, pequenos detalhes, diante do mundo que haviam, em dupla, criado. Entre suas histórias, a que mais os cativava era a de quando, sem medo, tentaram roubar a epístola do padre do bairro. “Digno de filme” – Roberto sempre dizia.

Suas personalidades eram um tanto peculiares. Seu João, o velho gaúcho dono da padaria, adorava conversar com Junior sobre os clássicos filmes que: “Não são como os de hoje, guri” – sempre dizia ele. Junior apenas ignorava-o quando desandava a falar sobre “Alfred Hithcock”. Sabia que suas opiniões não seriam nem de longe analisadas pelo padeiro polaco, apenas sorria. Tinha um humor irônico, que de tão perfeito se escondia na face clara e sorridente emoldurada por cabelos cor de ouro. Sabia disso perfeitamente.

Ricardo não se fazia de rogado quando a situação exigisse uma piada. Era o bom menino engraçado da casa 23. Mas só ele próprio sabia que sua raiva um dia explodiria. Cultivava-a com certo ardor. Era para ele uma pequena planta que, com certeza, um dia se desmancharia em flor. Suas flores, que distribuiria sem nenhuma piedade.

De certa etapa da vida dos dois meninos, é melhor poupar-se. A vida fez o trabalho de encaminhá-los por muitas situações até chegarem a dividir um pequeno apartamento no centro do Rio de Janeiro.

Depois de uma noite cheia de idéias e possibilidades, eles estavam prontos para o roubo.
- Passe por ele como se nada acontecesse.
- Ok, mas onde eu pego a pasta?
- Relaxa. Eu conheço tudo neste banco, assim que me ver entrar na sala do gerente para tirar cópias de documentos, peça-o para ir ao banheiro. No banheiro pegue a mala preta na segunda cabine.
- Mas como eu vou sair daqui.
- Não vai. Entre no banheiro feminino e espere 10 minutos.
- E saio?
- Sim, correndo! O Guarda vai estar ocupado com a mulher que vai dar um chilique na fila. Pode confiar.
E lá foram eles...

Por Lucas Moratelli

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Vazio;

Incrível era seu mundo: florido, colorido e amado. Era o centro, era o rei, era Danilo.

- O que você está fazendo aqui?
- Não sei mesmo.
- Ué, não me diga que seus pensamentos te trouxeram.
- Quem sabe. Ultimamente eles tem me levado a uns lugares tão estranhos.
- Ta bem. Mas vai ficar aí parado, ou pode me ajudar?
- Ajudo.
- Pega aquelas caixas ali. O idiota do Roberto não veio hoje.
- Ele morreu.
- Mas como guri?
- Morreu ué.
- Entendi, mas como?
- Sei lá. Acho que foi assassinado ou coisa assim.
- Mas gente! E ninguém me avisa? Eu poderia ter mandado flores, ou sei lá, uma garrafa de Vodka pro seu Pedro.
- Ah, esquece isso.
- Tudo é tão fácil pra você, não é Danilo? Até parece que você não o amava.
- Amava, mas chegou à hora dele, eu acho.
- Que menino mais frio!
- Para com isso Jorge. Não acho que seja necessário tudo isso.
- Um dia teu mundo caí. Aí eu quero ser o primeiro a te dizer "Eu te avisei".
- Ok, um dia avise.
- Não seja malcriado Danilo.
- Não serei. Cê me dá o emprego do Roberto?
- Porque você quer o emprego do seu irmão?
- Não sei. Vai ver que meus pensamentos é que querem.
- Você começa na segunda. E manda meus pêsames a teu pai.

De cinza pintou-se o mundo de Danilo. Suas flores deram lugar a cactos. Seu amor não tinha mais.


Por Lucas Moratelli



domingo, 5 de outubro de 2008

Ritalina;



Melhor mesmo era pintar de preto. Rita decidira pintar de verde. De que vale a opinião do escritor, afinal?

Estive toda a tarde a procura de uma ação, uma simples ação, que me deixasse começar a falar sobre Rita. E a ingrata, assim que acho o começo de seu conto, me ignora e escolhe o verde para cor de suas fracas e ruídas unhas.


Deveria parar de uma vez de escrever e voltar ao meu trabalho de tradução, ao qual nem tenho dado a atenção necessária nos últimos dias, tudo por causa de Rita.

Não consigo explicar a personalidade desta mulher, talvez devesse matá-la assim que terminar de passar o pincel do vidro de esmalte pela última unha. Quem sabe um assaltante de banco apavorado tentando se esconder no apartamento apertado de Rita, ou então um tombo mortal ao sair da sala na ânsia de apagar o fogo do feijão. Ou então uma irônica morte por alergia ao cheiro do esmalte. Não, Rita não merece a morte. E além do mais, detesto imaginar coisas mortas.

E já consigo ver como será a noite de minha personagem. Vai comer qualquer coisa, abrir um livro de poesia e ser invadida por um sentimento qualquer. Talvez ódio, inocente, mas ódio.

A dor de possuí-la começa a me incomodar. As coisas que faço desde uma simples crônica a uma visita a biblioteca pública são rodeadas pelo cheiro de Rita. Cheiro forte parecido com cheiro de remédio, algo com Lina no nome. Ritalina talvez.

Depois de viver por três meses com a cena de Ritalina pintando as unhas de verde, meu amor não me deixa terminar seu conto. Prefiro que fique assim, eterna, com seu cheiro a me perseguir.


(* Copiei na caroça a idéia de fazer uma capa pro conto, mas não ficou tão boa quanto as dele. Blog: Muitos Em Um)